sexta-feira, 14 de agosto de 2009

E aconteceu de novo...

Pois é, mais uma situação delicada em coletivos. A concentração de pessoas num espaço pequeno permite experiências interessantes, na maioria das vezes fazendo rever o que se tem por técnica na sua forma mais acessível.

Dessa vez, duas crianças se encarregaram de me mostrar, mais uma vez, uma triste realidade brasileira. Assim que eu entrei no trem, uma delas que estava sentada na chão se moveu para próximo de onde estava seu colega, sentado. O que me deixou impressionado foi a pouca idade das crianças, pequenas, pele-e-osso, no máximo 10 anos de idade e com tão pouca idade apenas conseguir conversar com seu colega em tom de ameaças, xingamento, críticas, impaciência, irritabilidade. Conheço crianças assim pequenas tão diferentes, podemos imaginar tanto a causa desse comportamento, seja ausência dos pais, experiências indesejáveis, amigos em situação e relação de violência, como também o que significa essa forma de falar; um tom alto e forte que tentam alcançar para exprimir um modo de se relacionar marcado pela violência.

Tudo se passou alí, perto de mim e de quem mais estivesse por lá no vagão ouvindo. A percepção do todo que permanece para mim é a expressão de violência como forma de denúncia, sem uso de artifícios para ser gritante. Conversando com pedagogos que tem trabalho ativo na sala de aula com crianças dessa idade, é comum ouvir que crianças que recebem pouco ou nenhum cuidado parental são as mais carentes e difíceis de se lidar e ensinar, i.e. normalmente as que tem um comportamento que procura ser mais aparente que os das outras crianças, seja gritando, usando tom de ameça, apegando-se a símbolos e mostrando a soberania deste, mostrando um comportamento irratidiço, baixa iniciativa e participação nas atividades propostas. Como não era uma sala de aula, mas um vagão de trem e o tema não era sobre português ou matemática, mas que "o coro tá comendo", há algo bem diferente aí e eu não penso que seja para o bom desenvolvimento.

Ah sim, a parte técnica, nessas horas é que se pensa quanto temos de capacidade para lidar com esse tipo de situação, se é que lidamos, ainda sem ensino claro e direcionado na nossa formação. A escuta nessas horas se mostra o pilar da técnica, pois é dela que se baseará todo planejamento e ação. Vale lembrar que a personalidade terá papel fundamental pois é dela que se estabelecerá uma forma progessiva de confiança e influência, acima de tudo, para iniciativa e contexto.

Outras perguntas e considerações:

• Será que o modelo de consultório, de fazer essas crianças se dirigirem a um local que não é o ambiente em que elas passaram a grande parte da sua juventudade, quem sabe o restante de sua vida, não é limitado e descontextualizado?

• Seria a clínica ampliada, sem uma instrução clara no currículo atual da maioria das faculdades de psicologia uma forma de superar esse tipo de limitação?

• Clínica se faz no local. Todo local é um bom local e não há necessidade de um enquadre tão rigido como na psicoterapia.

• Como há muitas pessoas, a personalidade do profissional se mostra aparente. Ponderando sobre isso no momento, lembrei-me de uma oficina de psicodrama (precisamente sóciodrama) e o quanto ela me foi útil para conhecer técnicas de relaxamento, socialização, contextualização, confiança, reciprocidade, exposição, autoconhecimento e enfim, uma forma bem prática de fazer pensar, refletir.

Vou procurar artigos relacionados e postarei em breve.

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